sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Caixas

Em um dia qualquer, lá estava Santinha sentada na cadeira mofada no fundo da sala escura, com cabeça baixa, mãos delicadas no rosto fino, a pensar!
- Como sou fraca... Sensível... Estúpida! Por que me deixei levar? Como fiz isso?
Mesmo que o tempo havia passado desde aquela conversa, Santinha guardava consigo apertos e um grande arrependimento. Sempre que tinha uma oportunidade de estar só, sentava sempre na mesma cadeira e se lamentava.
Às vezes, punha uma caixa no colo, abria, observava; e, por fim, chorava dentro dela. Todo o rancor e amargura ela guardava dentro delas. Quando estava demasiadamente triste, pegava as menores caixas para que pudesse esmagar sua dor. Não fazia nada para se ajudar. Apenas sentava, abria, olhava e guardava. Guardava, guardava, guardava.
Em mais uma tarde qualquer, Santinha começou a se lembrar novamente do terror que a perseguia. Aquele maldito dia em que tudo ficou tão escuro, que mal dava para enxergar uma felicidade próxima...
Há uns três anos estavam os dois sentados em uma cafeteria, se olhavam como duas crianças inocentes, se matando de tanto rir, até o momento em que a conversa desandou e as bocas apenas abriam para soltar os insultos. Santinha fitava Romão com certo ódio, misturado com dor e pena.
- Por que você fez isso comigo? – sussurrava Santinha, enquanto as lágrimas escorriam pelo rosto.
- Querida, não foi intenção e muito menos planejado. Foi um desejo incontrolável que mal pude evitar. Se estivesse em meu lugar, saberia.
- E se estivesse no meu, sentiria como dói, o quanto dói ouvir suas palavras.
Mesmo que, depois de tudo que o homem havia feito, ela concedeu um sincero perdão. Enquanto ele estava se divertindo noites afora, ela estava lá, guardando mágoas em suas caixas.
De vez em quando recebia visitas, que admiravam sempre as lindas caixas que cobriam partes da casa, que faziam as pessoas pararem durante minutos para ficarem observando seus mínimos detalhes.
A maioria das visitas tinha brilho nos olhos ao vê-las. Até se esqueciam, no meio de tantas cores, que Santinha existia e estava fazendo um esforço de preparar um café da tarde para elas.
O que ninguém sabia era o que tinha dentro delas, pois Santinha evitava que as abrissem. Essas pessoas sentiam um grande peso. O mistério do que havia dentro delas nunca fora desvendado.
O que elas não sabiam é que as caixas não eram tão magníficas quanto pensavam. Eram escuras, perdidas, frias por dentro. Vazias.

agosto/2006

Nenhum comentário:

Postar um comentário